Tempos de euforia versus a realidade | Pluri Consultoria


Tempos de euforia versus a realidade
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Na próxima
segunda-feira, dia 28, acordaremos mais ricos, todos nós, os mais de 192
milhões de brasileiros. Nessa data, segundo projeção do economista
Fernando Pinto Ferreira, da Pluri Consultoria, ultrapassaremos o Reino
Unido na corrida para “país mais rico do mundo”: sairemos da sétima para
a sexta posição. Lá na frente, com várias voltas de vantagens, Estados
Unidos. Começando a aparecer no retrovisor, a China. Depois o Japão, a
Alemanha, a França e… Nós! Brasil!
Há um pequeno problema no parágrafo
acima e, acredito e espero, alguns já notaram: esse negócio de sexto
“mais rico do mundo” é bobagem. Estamos falando apenas e tão somente do
país vir a ser a sexta maior economia do mundo, o sexto maior PIB
planetário, como destaca o estudo. Bom, não é nada, não é nada, já é
alguma coisa muito positiva, mas os efeitos desse crescimento são ainda
esparsos para a maioria. Lembram aquela velha questão sempre tão
abordada nas campanhas eleitorais e depois esquecida, a distribuição de
renda? Pois é, lembrando que boa distribuição de renda não deve se dar
somente entre pessoas, mas também entre cidades, regiões, estados.
Apesar disso, há mesmo um clima de
euforia pelo país por conta dos números da economia, ainda que um bocado
artificial. Convém lembrar que, sob uma ótica mais rigorosa, estamos
crescendo de forma desequilibrada e num período em que as economias
tradicionalmente mais fortes sofrem com ajustes ou necessidade deles. E
boa parte de nossa receita e sustentação se dá por meio do comércio com
essas economias, justamente.
 
Saindo do caderno de economia para o de
futebol: Neymar ficou. Ronaldinho voltou. Lucas quer ficar. Fred faz
sucesso. Conca se foi, mas Montillo está entre nós e fala-se, novamente,
que Carlitos pode voltar. Dedé já disse que fica, só depende do clube.
Luis Fabiano reinicia sua trajetória e o mesmo começa a acontecer com
Adriano.
O mercado de contratações ainda está
fechado, mas o mercado de boatos está ligado em força máxima, turbinado
pelas expectativas, pelo dinheiro novo dos direitos de transmissão do
Brasileiro, pelas receitas de marketing. Como pano de fundo, 2014 e a
Copa entre nós, além daquela euforia citada nos parágrafos iniciais. Com
a devida licença do Milton, que beleza!
 
É chato fazer o papel do chato, mas,
com tanta festa é bom olhar alguns números. Em 31 de dezembro de 2010
nenhum de nossos clubes ostentava uma situação econômico-financeira de
causar entusiasmo, muito pelo contrário, até, para a maioria. A rigor,
desde o réveillon que abriu o corrente ano a única mudança de porte foi a
assinatura dos novos contratos de direitos de transmissão.
E Neymar, claro. Porém, se os contratos
de cessão de direitos de broadcasting contemplaram todos os clubes, uns
mais, outros um pouco menos, Neymar é único e é caso único. Sua
permanência no Brasil e no Santos é fruto de sua total atipicidade como
jogador e como personalidade, ainda mais em idade tão precoce. Parabéns
ao Neymar pai que, sem a menor dúvida, soube como orientar o
desenvolvimento do filho. E à direção do Santos, com um colegiado
próprio, com o presidente Luiz Álvaro à frente, que está apostando em
sua permanência como forma de manter um time de alto nível, alta
performance e alta atração para torcedores, empresas e, simplesmente,
para quem gosta de futebol. Algumas apostas do clube na permanência do
atleta são plenamente factíveis, outras, porém, como crescimento de
torcida, dependerão de combinações de fatores que poderão ou não vir a
acontecer. E uma, a aposta no retorno financeiro proporcionado pelo
atleta, já acontece. A assinatura do contrato do atleta com o Banco
Santander – que já tem Pelé em sua folha de pagamentos – é mais uma
confirmação disso tudo. A maior parte do valor a ser pago pelo banco
espanhol irá para a conta de Neymar. Falou-se em 70%, fala-se em 90%, o
que talvez não seja tão importante. Importante e certo, entretanto, é o
fato em si: Neymar fica graças à força do marketing.
Ou graças à sua personalidade?
 
Não há novidade no fato de dirigentes
acenarem com receitas de marketing para bancarem contratações de vulto,
principalmente os desembolsos mensais para manter o contratado, feliz,
em suas fileiras. Na prática, o que mais aconteceu foi dos próprios
clubes assumirem, mais cedo ou mais tarde, a totalidade do pagamento de
seus atletas, ou boa parte dele.
Para se manter no topo e atrair a
atenção do consumidor para si, um jogador de futebol precisa do grupo,
precisa do time, precisa jogar bem, sem dúvida, mas precisa, também, que
o time jogue bem e se mantenha no centro das atenções. Para que isso
ocorra, o clube precisa ter um bom elenco, que permita ao treinador
montar time equilibrado, bom o bastante para disputar para valer todas
as competições. Em times bem montados o futebol do craque aparece mais
e, principalmente, rende muito mais. Futebol é conjunto e o brilho
individual é mais intenso quando se destaca em meio ao bom conjunto.
O problema é que muitas vezes olha-se
apenas para o craque, esperando que ele tudo resolva, sozinho, somente
com o peso de seu nome e a magia de seu futebol.
Ora, nem Pelé dava conta de tal recado! Como Rivelino não deu conta no Corinthians, onde foi o astro único durante anos.
Portanto, um bom time é preciso. E
disso o marketing não dá conta, é o clube que precisa ter as condições
para formar e mantê-lo. Voltamos, então, à necessidade de boa gestão e,
posso estar enganado, parece-me que o ímpeto por contratações
impactantes está sobrepujando a prudência e a razão. Ao prometer pagar
500.000 mensais para um jogador, um clube está se comprometendo, na
verdade, a pagar algo como 8 a 9 milhões – no mínimo – todo ano. Um só
jogador, ou seja, mais ou menos 3% a 3,5% do elenco profissional,
consumirá algo como 15% a 20% de uma folha salarial de bom tamanho para o
futebol brasileiro.
Velhas questões começarão, mais ou mais
tarde, ora num, ora noutro clube, a entrar em campo: o quanto de
dinheiro vai sobrar para quem estiver carregando o time nas costas.
Porque isso acontece, invariavelmente, uma vez que nem mesmo o craque é
dotado de um organismo que não seja, meramente, humano.
Portanto, marketing é ótimo, é muito bom, mas não é santo milagreiro. Principalmente em tempos eufóricos.

Fonte: Site Globo Esporte qui, 24/11/11 por Emerson Gonçalveshttp://globoesporte.globo.com/platb/olharcronicoesportivo/2011/11/24/tempos-de-euforia-versus-a-realidade/